terça-feira, 15 de setembro de 2020

Pisa - Valorização dos Professores

Por Fabio Manzano e Elida Oliveira, G1

 


O Brasil não conseguiu melhorar o desempenho dos estudantes em leitura, matemática e ciências no Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa, na sigla em inglês). A edição de 2018 do relatório foi divulgada na manhã desta terça-feira (3).

O Pisa é uma avaliação internacional da educação com provas que atestam o nível de compreensão dos estudantes com 15 anos. Além dos testes de leitura, matemática e ciência, são também aplicados questionários a estudantes, professores, diretores e escolas e pais. O Brasil participa desde os anos 2000 e, na análise histórica, tem tendência à estagnação do desempenho.

Especialistas ouvidos pelo G1 destacaram a valorização de professores como forma de melhorar o resultado brasileiro. Eles também afirmam que é necessário investir em políticas públicas de longo prazo.

Os resultados do Brasil no Pisa 2018 mostram que a maioria dos estudantes continua no nível abaixo do considerado básico em leitura, matemática e ciências — Foto: Juliane Monteiro e Aparecido Gonçalves/G1

Os resultados do Brasil no Pisa 2018 mostram que a maioria dos estudantes continua no nível abaixo do considerado básico em leitura, matemática e ciências — Foto: Juliane Monteiro e Aparecido Gonçalves/G1

Rosalina Soares, assessora de pesquisa e avaliação da Fundação Roberto Marinho, destaca que, mesmo em crise, é importante que o país invista em educação.

"Em momento de crise, o melhor investimento é em educação. Isso não vai resolver todos os problemas, mas sem ela, não vamos sair de onde nos encontramos", afirma. "Devemos investir em alfabetização na idade certa para que a trajetória escolar seja bem sucedida, investir em creches. O custo total por aluno, por município, ainda é muito baixo" – Rosalina Soares, da Fundação Roberto Marinho

Para o diretor de políticas educacionais do Todos Pela Educação, Olavo Nogueira Filho, a estagnação vem desde 2009 e está em "um patamar muito baixo". Segundo ele, ficar estagnado não é em si um problema e outros países passaram por isso, mas ele considera que o Brasil "bateu no teto muito cedo".

"O que nos diferencia dos países com alto desempenho [no Pisa] é que não colocamos ainda a profissão docente e políticas para estes profissionais como ponto central" – Olavo Nogueira Filho, do Todos pela Educação

Mozart Neves Ramos, diretor de Articulação e Inovação do Instituto Ayrton Senna, destaca a falta de continuidade nas políticas públicas brasileiras. Ele cita casos como o do estado do Ceará, que está avançando nos índices de educação investindo na alfabetização de crianças, e da Paraíba, que está focando em escolas de tempo integral.

"O Brasil vem ampliando o investimento desde 2015, principalmente nos exames finais e no ensino médio, mas a descontinuidade tem atrapalhado o país. O Brasil tem experiências fabulosas no campo da educação, mas está restrito a alguns territórios e estados. Isso deveria ser ampliado" – Mozart Neves Ramos, do Instituto Ayrton Senna

Já Ana Lúcia Lima, fundadora da Conhecimento Social e organizadora do Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf), destaca que o domínio da leitura poderia garantir aos jovens a redução da desigualdade social.

Os novos dados do Pisa trazem, mais uma vez, um importante alerta: o crescente avanço na escolaridade de nossas crianças, adolescentes e jovens não tem sido suficiente para assegurar o domínio de habilidades de leitura que permitam seu desenvolvimento individual e a construção de uma sociedade menos desigual e mais preparada para os complexos desafios dos nossos tempos", afirma.

"Mais do que comparar os resultados do Brasil com o de outros países em rankings de duvidosa utilidade, é preciso pensar que nossos meninos e meninas que participam do Pisa hoje aos 15 anos terão trajetórias de vida menos potentes do que aquelas asseguradas aos cidadãos dos países que nos superam. Até quando vamos conviver com essa realidade sem assumir, como sociedade, a responsabilidade por virar esse jogo?” – Ana Lúcia Lima, organizadora do Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf)

Mariana Luz, CEO da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal, afirma que a solução dos problemas da educação no Brasil não tem somente uma resposta, mas o investimento na educação infantil "é uma estratégia fundamental".

"Há inúmeras pesquisas feitas em diferentes países que demostram o impacto da educação infantil de qualidade para a aprendizagem nas etapas seguintes da educação. É uma 'janela de oportunidades'. É nessa fase que se formam as bases de aprendizado que serão utilizadas ao longo de toda a vida. Nesta fase da vida, a evolução do cérebro ocorre em uma velocidade incrível – mais de 1 milhão de conexões por segundo" – Mariana Luz, da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal

Ela cita James Heckman, prêmio Nobel de Economia do ano 2000, cujos estudos mostram que uma educação infantil de qualidade tem efeitos no desenvolvimento emocional e cognitivo ao longo de toda a vida. Outro estudo que ela destaca é o da Associação Americana de Pesquisas Educacionais, de 2017, que revelou que o acesso a uma pré-escola de qualidade diminuía em oito pontos percentuais a reprovação no ensino médio, e aumentava em 11 pontos a conclusão desta etapa nos Estados Unidos.

Outro estudo, feito na Etiópia com crianças beneficiárias do programa Save The Children, mostrou que as crianças mais pobres que frequentaram a educação infantil tiveram um ganho de 42% em linguagem. As de classe média, 34%, e as de classes mais altas, 25%.

Ya Jen Chang, presidente do Instituto Sidarta, que aplica no Brasil o programa Mentalidades Matemáticas da Universidade de Stanford, afirma que uma das hipóteses que podem explicar o baixo resultado na avaliação em matemática é o modo como se enxerga a disciplina. "Acredita-se que matemática é um dom, para poucos. Mas é possível aprender matemática em alto nível", diz.

"O ensino da matemática no Brasil é focado nos procedimentos e na memorização, o que não eleva a aprendizagem e ainda gera alto nível de ansiedade. A matemática deve ser apresentada de forma aberta, criativa e visual, compreensível e aplicável. Em vez de perguntar à criança quanto é 18x5, que tal descobrir de quantas formas diferentes se chega ao resultado de 18x5? E representar visualmente as soluções? É uma matemática mais profunda, que inclusive desafia a ideia de que é preciso ser rápido para ser bom em matemática" – Ya Jen Chang, do Instituto Sidarta

Ricardo Henriques, ex-secretário Nacional de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (SECAD) do Ministério da Educação e atual superintendente do Instituto Unibanco, diz que a solução para a educação está na gestão e formação de professores.

“O relatório da OCDE mostra que os países que investiram no combate à desigualdade e ofertaram um ensino de excelência para toda a população foram os que mais se destacaram no Pisa. A solução para a Educação não virá de fórmulas mirabolantes, mas de atuação eficiente no ordinário da educação, ou seja, gestão, orçamento, infraestrutura, formação de professores e condições de trabalho. O caminho da transformação é ofertar excelência com equidade para todos” – Ricardo Henriques, do Instituto Unibanco

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